sexta-feira, abril 29, 2005

Paul Auster

Encontro com Paul Auster, conversas e coisas que tais, hoje, na Culturgest pelas 21.30 ou amanhã, pela mesma hora, na Fnac do Chiado, em Lisboa.

Jovem, contamos contigo! Se tens mais de 18 anos e o 10º ano de escolaridade, não percas a oportunidade de contactar com uma figura incontornável das montras e escaparates universais.

vai já a www.culturgest.pt/actual/paul_auster.html

quinta-feira, abril 28, 2005

infância

escavar escavar
uma cartografia perdida
e ficar apenas com um rio bem turvo na mão


sentido

compreender a origem falsa
destes círculos concêntricos e infinitos
que chapinham a vida


[aseiçaneves]

quarta-feira, abril 27, 2005

depuração

resistir. resistir. tens que resistir à incineração dos teus textos. agora desaparecido o caderno inteiro. agora fugida a lupa da palavra. agora aguenta-te. tens memória e terás memória. pensa antes em actuar. actuar. não fiques aí a esmurrar a testa no orvalho e no muro reduzido. resistir. resistir. sei. sei. sei que a tua identidade se evaporou em parte com essa perda. a perda. a perda. sempre a perda. mas resiste. resiste. tens que resistir à criação e depois à destruição. sei sei. sei que foram milhares de palavras combinadas de forma inovadora. única. roubadas pelo vento. sei. sei que a combustão foi mais forte. mas tens de resistir. resistir a tudo. mesmo quando te arrancarem os dedos. a língua. e os braços. quando te arrancarem quase tudo já pouco te restará. mas terás ainda a memória. e sabes que a memória é depuração. depuração.
cada vez mais perto da brevidade. limando-se ao máxima. limando-se força. resta-te pouco. sei. sei. resta-te a rescrita. resta-te a rescrita. e aí. e aí há possibilidade total. total. pensa antes assim. depuração. depuração.
ca vez mais per da da. ma má. ma for. res pou. sei. sei. res a cri. res a cri. e aí. e aí da tal. tal. pen an ssim. ão. ão.
sei. sei. sei que te dói corrosiva essa perda. sei. deixa corroer. deixa. mas por favor não pares de depurar. depuração. depuração.
sei. sei. sei que te dói si e per. sei. dei er. dei. mas por vor não pa de rar. ão. ão.

e.e.

terça-feira, abril 26, 2005

I Ching, o Livro das Mutações

Entre as edições em português do I Ching, existe uma da editora Pensamento, de São Paulo, que inclui o prefácio de C. G. Jung. É portanto esta que recomendaria a quem quisesse possuir um exemplar do Livro das Mutações. Em outro post, citei o referido prefácio (assinado por Jung) a propósito do conceito de sincronicidade.
A forma como o leitor utiliza o livro não é de somenos importância. Em primeiro lugar, o I Ching tem que ser encarado como uma entidade autónoma, na minha perspectiva, como uma espécie de pêndulo vibratório das configurações possíveis do universo. Neste sentido, ainda na minha perspectiva, o I Ching é uma mónada (como Leibniz a define).
O livro não deve ser interrogado em termos de sim ou não e, neste aspecto, ele está longe de ser normativo. A pergunta é uma forma de desenhar secções no universo das possibilidades e o I Ching responde, dizendo, não que se deve ir por aqui, ou por ali, mas sim fazendo notar o que significa ir por um certo caminho. Ir por um certo caminho é ganhar (se é que este termo faz sentido...) um conjunto de coisas e perder outras tantas, que ganhariamos se fossemos por outro caminho.
O I Ching é profundamente contrário à ideia de destino. Na verdade, o grande Livro das Mutações respeita inteiramente a liberdade humana.

Daniel Tércio

www.nudescendoescadas.blogspot.com

segunda-feira, abril 25, 2005

aseiçaneves

?avesso o será dois dos qual mas
avesso do tudo está. verificas então e
tua a como bem! acertaste! exacto!
balofa bem barriga uma
cima para barriga de chão no deita-se alguém esse e
galgá-la antes
padieira a seria caso teu no que
soleira a soleira a mesmo pisar pode se não
chinês tailandês templo num como
sabes? sagrada é soleira a
pois
soleira a pisa não
porta pela entra alguém que reparas e
simétrico teu do tecto o serás tu
chão
afinal
é tudo que vês tecto no e
tecto o verificas então e
)tua a como bem! acertaste! exacto!
balofa bem barriga uma
cima para barriga de chão no deitas-te
deitas-te quarto nesse e
porta uma menos
pelo com quarto um mas quarto teu o não
quarto um a
quarto um a então chegas
avesso do está tudo corres e saltas enquanto
paredes nas
avesso do vultos com enormes corredores por sais
piso neste sais: nota(

avesso

sábado, abril 23, 2005

istmo

o assunto começou num bar de jazz. era dia de cadeiras e mesas cheias. de pessoas e músicos. a sala recebera uma enxurrada de suor e cabeças. no prolongamento da bebida. da bebida. a melodia ia escorregando para dentro da garganta. do esófago. o clima transpirava-se em concentração. intensa. o piano esbracejava melancolia alternada em violentas notas. tons. claves. os dedos do contrabaixista gemiam nas cordas do instrumento tornado corpo. tornado prótese. tornado mais tarde. mais tarde improvisação. mais tarde amante. amante. a quem se toca. a quem se deixa tocar. amantes dançando. osmose rara. momentânea. e as mãos. aranhas que deslizam música perfurada. e dedilha-se. dedilha-se sexo e magnetismo música perfurada. e os indicadores iniciam a sua viagem de cisnes. e a bateria cavalga em energia espantada. espasmos. espasmos em uníssono. e o ambiente cada vez mais pesado exigindo ar. oxigénio que aqui respira-se. mas o oxigénio já foi todo consumido pela música diabólica. e os cigarros contorcendo-se pela sala também. e o fumo condensando os olhos. o fumo apertando as lágrimas. os olhos a tentarem humedecer. e os olhos não conseguindo. os olhos secos. pesados. o fumo pesado. e as pessoas pesadas. e a música a deslizar gargantas esófagos estômagos apertando a traqueia. e ouve-se. o final. toada trovejando prisão exterior. a liberdade. qual nota desprendendo-se como um istmo único. e a música. a música. uma recta por definição infinita.

e.e.

sexta-feira, abril 22, 2005

labirintório

a fausto apetece desistir. isso já não é de agora apetecer desistir. morrer, por exemplo. o mais difícil é resistir à raiva. e encontrar forças nas partes que estão partidas.
como encontrar a força numa fractura? num osso fissurado? como conseguir reunir os ossos espalhados pelo chão e disso fazer um esqueleto mais forte e mais eficaz?
é difícil erguer as mãos contra o dia, em luta corpo a corpo com a vida, quando as noites são tão vividas dentro dos sonhos. é a vida que está errada, não os sonhos. fausto sonho cada vez mais, com a cabeça toda, com toda a energia da imaginação e todo o poder da lógica. sonha tanto que quando acorda olha para o dia e pensa "estou estafado disto tudo" e "não me apetece fazer nada".
e depois vai para o labirintório. e fica entretido a misturar elementos, a mexer em godés e em aparelhos de medição. fica a misturar elementos sem razão nem objectivo apenas para ver as cores diluirem-se umas nas outras. no seu labirintório interessa-se particularmente pela passagem do ferro à ferrugem. usa para isso de um diluente chamado tempo. um diluente aparentemente fraco mas que é capaz de destruir mais a fundo que o ácido sulfúrico. é um diluente que é capaz de actuar poderosamente sobre a matéria e alterar os estados do mundo.
a isso fausto chama "poesia", talvez erradamente.

Rafael Dionísio

www.rafael-dionisio.blogspot.com

quinta-feira, abril 21, 2005

uníssono

o mar o bulício o pó de água o mar tudo retumbando e as tenras nuvens intercaladas até ao horizonte e as outras batidas pelo sol mais próximas e outras ainda mais densas carregando as chumbeiras dos pescadores e um novo horizonte albino e o mar e o mar o mar furioso prenhe e árido o mar e as ondas cerrando muros violentos contra ondas e ondas em contramão e mais ondas como buganvílias alagando o areal e as ondas cinzeladas a cinza e as nuvens cinzeladas a cinza e uma faixa branca entre ambas e o vociferar poderoso do mar contra as escarpas das rochas estancadas a pique as rochas e o mar e as nuvens e as ondas e o céu maior que a visão humana e as nuvens entrando no mar e as ondas avançando luminosas praia dentro e toda a memória e mundo e toda a cinza cerebral toda a cinza cerebral e toda a hibernação derrubada na praia engolida pela água e o mar e o sol e as nuvens e as ondas e a prata opaca e as rochas cristalinas penetrando os olhos e tudo tudo a reciclar barbas antigas no mar galgado a bronze e tudo de súbito impresso na memória que um tempo permanecerá cegamente até à cova final finalmente holograma do mundo guardado uníssono

e.e.

quarta-feira, abril 20, 2005

José

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, proptesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você consasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?


Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, abril 18, 2005

the wavemen

www.wavemen.net




lucien zell's band @ prague





lyrics

So far, so close

I have passed through many lives
and of all the clouds that passed me by
only a puddle survives...
but the puddle reflects the skies.
A sunset is as beautiful as a sunrise.

So far, so close.

Come a little closer baby,
leave the rest of the world behind.
You don't need those plastic teachers
to polish your crystal mind.
If you're gonna follow someone,
don't follow the blind.
The truth is often friendly,
but it isn't always kind.

So far, so close.
It doesn't matter what you fake, you break, you take;
you can't know you've been sleeping until you're awake.

If you're lost in the labyrinth, take my hand.
What you love is more important than what you understand.
I used to believe in God's plan,
until I arrived at a great surprise:
God has no plan...
He prefers to improvise!

So far, so close.

Well, the face in the mirror
doesn't look much like mine;
but the grapes of wrath must be crushed
to blossom into wine...
more human is more divine!

So far, so close.
It doesn't matter what you fake, you take, you break;
you can't know you've been sleeping until you're awake.

Lucien Zell inside Wavemen
TARA PERDIDA de Eduardo F.M.
Teatro Taborda - Lisboa - 31 de Março a 8 de Maio

www.egeac.pt/taborda

EDUARDO F.M.

Nasceu em 1949, vive e trabalha em Lisboa. Escola primária em Manteigas, sua terra natal. No final dos anos 70, em Lisboa, conclui, em horário pos-laboral, o 1º e 2º ciclos do antigo curso do liceu. Autocidacta na prática artística, a sua obra conta centenas de trabalhos de desenho e pintura. Expõe pela primeira vez em 1985, numa pequena mostra colectiva realizada na Galeria EMI/Valentim de Carvalho, Lisboa.

Só em Setembro de 2002, apresenta a sua primeira exposição individual, na Livraria Assírio e Alvim, Lisboa – antológica da sua produção dos últimos dez anos.


TARA PERDIDA

Um membro (perna ou braço), um tronco, uma cabeça podem funcionar isoladamente, podem querer dizer um corpo inteiro e querem certamente dizer uma força de alma qualquer que se procura reter, dominar, transformar noutra coisa. Uma cor confina com outra: um negro, um vermelho; um negro, um branco; um vermelho, um branco – e tudo o que partilham é essa fronteira onde se tocam e se cruzam, onde alternam e jogam o peso da imagem. Uma cena de confronto simétrico ou desenvolvimento rizomático (e as dimensões alongadas dos suportes são essenciais nesta discursividade em extensão e intensidade) pode querer colocar-nos no centro do mundo.
É um mundo fechado, rodando em torno de um eixo (um olhar desvia-se, o outro enfrenta-o), um mundo desdobrando-se em personagens que se mostram e se escondem, como um tecido plissado que se pode estender (explicar-se) perdendo espessura e depois reduzir-se de novo ao seu volume inicial.

João Pinharanda


A obra de Eduardo F.M. possui uma espontaneidade que a aproxima de alguns artistas exteriores ao surrealismo, mas que foram apreciados por este movimento pela importância que deram às associações insólitas entre as formas animais e as formas humanizadas.

Luísa Soares de Oliveira


www.artistasunidos.pt

domingo, abril 17, 2005

paz

ceifar os pés
bombardeá-los para uma fossa distante
e correr até os apanhar

[aseiçaneves]

caputblog@hotmail.com

quinta-feira, abril 14, 2005

Michel Foucault, choses dites, choses vues
teatro na culturgest. lisboa

um espectáculo de Jean Jourdheuil e Mark Lammert

Um dispositivo reunindo um actor, um pintor e aquilo a que se convencionou chamar encenador, eis o ponto de partida de um trabalho formal utilizando os seguintes materiais: uma voz, um corpo, uma máquina arquitectónica, uma cor. Ao que se juntou, rapidamente, uma voz musical, a da "glass-harmónica". O texto foi elaborado a partir dos ensaios, das entrevistas, das conferências reunidas em Dits et Écrits e de uma intervenção radiofónica não publicada. Michel Foucault não saberia transformar-se em cena num autor ou numa personagem de teatro. Era preciso des-teatralizar para melhor espacializar e "re-presentar", de forma necessariamente abrupta e fragmentária, os motivos do seu pensamento. "Que importa quem fala, disse alguém, que importa quem fala" disse um dia Michel Foucault, citando Beckett, numa conferência intitulada "O que é um autor?". Esta questão, assim enunciada, vale para este espectáculo. A nossa ambição ao agir assim: interromper, durante uma noite, a transformação em ícone de Michel Foucault.

Jean Jourdheuil

Teatro
22 e 23 de Abril
21h30 Grande Auditório
Duração 1h00
Falado em francês com legendas em português
15 Euros
Até 30 anos: 5 euros


Programação paralela

21 de Abril, 18h30, Pequeno Auditório

Moi, Pierre Rivière, ayant égorgé ma mère, ma soeur et mon frère...
filme de René Allio (cenógrafo, pintor, realizador) a partir de um caso estudado por M. Foucault.
Apresentação de Jean Jourdheuil. Legendas em português.

22 de Abril, 18h30, Pequeno Auditório
A escrita, o espaço e o corpo
leitura encenada de textos de M. Foucault
com Jorge Silva Melo e Manuel Wiborg (organização J. Jourdheuil)

23 de Abril, 18h30, Pequeno Auditório
Debate sobre este espectáculo e a actualidade do pensamento de Foucault
com Philippe Artières (director do Centre Foucault), José Bragança de Miranda e J. Jourdheuil.


http://www.culturgest.pt/actual/michel_foucault.html

segunda-feira, abril 11, 2005

família

como te falar dos nossos silêncios dissonantes? como te falar. como. explicar-to. explicar-me. como.
primeiro apetece-me bufar-te. bufar-te. bufar-te que me empapa esse teu cristianismo. esse teu cristianismo feliz. sedimentado. sedimentado em milénios. sabes? encharcou. encharcou-se. impregnou-se devagarinho. devagarinho. sabes? apetece-me esfolá-lo. esfacelar a pele até que tudo minguasse numa sarjeta qualquer. ser-te sincero. ser-te sincero. e para isso preciso de o eliminar. eliminar. mas há esta infusão de racionalidade a que chamo. por agora. o impossível. talvez não só por agora mas por. para. durante. sempre. a impossível tarefa de esfarelar este nosso cristianismo da minha pele.
como escrevi: foram todos esses milénios de encrostação e ainda o meu nascimento. a infância. e o dia a dia ladeado de imposições. imposições semelhantes. semelhantes à educação que me ofereceste. a educação de arquitectar uma boa cofragem de personalidade. um molde apreendido ao longo de gerações. um molde certinho cujo desejo era regurgitar uma viga sem vícios. mas já percebeste. não é? sou um animal ácido de propriedade. ácido. e tenciono permanecer assim. assim. com várias vontades e uma fixação: esfolar. esfacelar. esfarelar. este cristianismo da minha pele.

e.e.

sábado, abril 09, 2005

inércia

orgasmo andar em contra-sentido. sentir as pessoas como alfinetes enfiando-se no meu peito e na minha cara. são 19:23. as membranas dilatam-se. entro no metro. orgasmo andar em contra-sentido. numa postura física oposta. uma contra-inércia. pensar na lei de velocidades de galileu e atravancá-la de pés e de massa orgânica negativa. caminhar no sentido do movimento da carruagem sabendo que isso me vai custar muito mais. sair do cordão umbilical que transporta toda a gente e deslocar-me numa escada rolante cujos degraus se atiram contra mim e trepá-la ferozmente e gritar vou subir esta treta toda em contra-sentido vou vou vou e subir tudo com as pernas a engrenarem-se e as canelas cortando-se nas lâminas metálicas dos frios degraus e subir subir subir até que os gémeos doam e não se possa mais de tanto esforço e trincar a língua. rebentar-lhe a pele. e correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr correr
rer rer rer rer rer rer rer rer

e.e.