terça-feira, julho 05, 2005

Pensamento Probabilístico Existencial

As probabilidades desempenham um papel de relevo nas tomadas de decisões que empreendemos no dia-a-dia. É Dezembro, estou no Porto, o dia amanheceu com nuvens e a temperatura é amena? Será melhor levar o guarda-chuva, pois há grande probabilidade de vir a chover. Tanto nos pequenos como nos grandes dilemas, a avaliação matemática do número de casos favoráveis a uma ocorrência versus o número total de casos possíveis é feita de um modo quase automático. É uma forma de pensar que, regra geral, é considerada válida e demonstra sensatez.
Há contudo algo que se contrapõe a esta regra, e que não me deixa em paz. Qual era, em boa verdade, a probabilidade de os meus pais me terem concebido? É algo que está dependente da probabilidade de eles se terem conhecido, de terem iniciado uma relação amorosa e de terem copulado, com a consequente união arbitrária de um gâmeta feminino e um gâmeta masculino, que me geraram e permitiram que eu nascesse. Grandes incertezas, estas que rodeiam a minha existência!
Sejamos ainda mais exaustivos: qual a probabilidade de os meus pais terem sequer nascido? Também eles foram fruto de um capricho de acaso e coincidência que engloba os seus pais, os pais dos seus pais, e por aí fora. Tudo isto misturado com múltiplas influências externas que modificam o rumo que parece mais provável: guerra, doenças, regimes políticos, catástrofes naturais e tudo o que se possa incluir na relação de interacção que os indivíduos têm com o meio. Se quisermos tornar as coisas ainda mais interessantes podemos recuar até à formação das primeiras formas de vida que se desenvolveram na sopa primitiva, que em si mesma já foi um caso espantoso, no sentido em que tiveram de se criar condições muito peculiares para a sua ocorrência.
Todo este conjunto de factores, que aparentam ser arbitrários, influenciou o meu nascimento. Assim, verificamos que num sentido temporal amplo e universal a probabilidade da existência de cada um de nós é um valor que tende para zero, um número infinitamente pequeno. Mas estamos aqui.
Não seremos a prova de que as probabilidades não são assim tão fiáveis, e que o mais improvável pode acabar por acontecer se lhe dermos o devido tempo?

Cristóvão Figueiredo

2 comentários:

R. disse...

sim. porque se deres mais tempo ao improvável, ele acaba por se tornar mais provável...é vertiginoso sabermo-nos presos à existência por um quase acaso que foi a nossa aparição, mas até tem a sua piada saber que até o mais infeliz dos seres aqui chegou porque é um vencedor na selecção natural.

Anónimo disse...

tudo depende do momento anterior à decisão. após decidirmos eliminamos outros tantos caminhos que derivariam noutros tantos e por aí fora. o acaso... ou talvez não...