quinta-feira, fevereiro 10, 2005

poder-se-ia escrever acerca da imagem no espelho
da imagem no espelho

interrogação

algumas passadas em hélice pelas condutas da cidade
outras pelos elevadores de várias direcções cérebro
acima cérebro abaixo
consegue-se até recordar restos de palavras deixadas
nalgum piso mais visível mais visível
e a interrogação parecendo dar à estampa
uma barriga menos inchada
acontece que vai mesmo é insuflando ar desconhecido
para dentro da curva
passadas em hélice e volta-se volta-se
volta-se ao mesmo com outros restos
e surge então a tese poética arfando vaidade sabendo porém
que de pus e bolor está ela prenhe:
a imagem no espelho esquece-se que diz nada
um nada sereno mas um nada
que autoridade habilitou de credenciais esse objecto nomeado espelho?
avisem-no rapidamente!
mas quem? o quê? quem?
não bastasse já o espelho mais o contra-espelho e o do lado direito e esquerdo e oblíquo e horizontal e vertical e diagonal e outras possibilidades não academicamente registadas e sobre as quais não apetece escrever
seriam vários ângulos da mesma face daquele rosto insondável
sabendo-se real na simples imagem na simples imagem concreta
concreta de vidro tão concreta como ser imagem e ser espelho e ser imagem debaixo da pele do espelho e realmente falsa como esse rosto
esse rosto insondável insondável
e então era um cubismo
mas não aquele cubismo de feira
aquele cubismo vendido aos pacotes por professores e certo escol e outras entidades riquíssimas para fazer um bom kebab de sabedoria
não se fala nesse
fala-se da essência de um cubismo presente
claro que como tudo seria insuficiente
percebe-se não é?
o que se prende à fórmula e se deixa permanecer no saco-cama de um horizonte segmentado esse bom esse já era
sabem?
como as bolas de ténis: havia uma marca era de facto era
no primeiro jogo desapareceram todas: mas que interessa?
memórias
sempre iguais: a perturbar qualquer momento
então: não só uma essência cubista
mas
sobreposições isso: sobreposições!
porções não mensuráveis de imagens sobrepostas num caos mais ou menos
equilibrado: seria o êxtase não?
ou então um espelho rachado
rachado há muito por um bacon qualquer
um bacon fracturado dos olhos em transe consciente
estilhaçado no seu sangue
esquartejado e ainda assim revendo-se
isso: seria assim!
um cubismo muralhado
um espelho desfeito
e um sobreposicionismo ah! sim!
só sobreposições: imagem em cima de imagem
mais imagem e ainda outra outra imagem
e teríamos o espelho traseiro acenando todo o dia uma imagem que desconheceríamos
mas seria nossa
seria a imagem absoluta de um absurdo total
um absurdo sempre variável e só nosso só nosso
e não esta merda que todas as madrugadas ao acordar surge no espelho e
tonitroando
troça: cabrão! mais um dia com esse focinho alegre não é?
e de facto é: é o focinho envelhecendo vaidoso
da sua cobardia constante

aseiçaneves

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